Avançar para o conteúdo principal

Lady Chatterley's Lover

Há livros que me levantam questões várias. No caso do Lady Chatterley's Lover, é o porquê do estatuto de clássico: será a história do livro assim tão intemporal ou será mais o julgamento por obscenidade?


A história é simples: o livro é relatado da perspectiva (ainda que na terceira pessoa) de Connie/Constance. Esta, criada de forma liberal (sobre ela e a irmã: They lived freely among the students, they argued with the men over philosophical, sociological and artistic matters, they were just as good as the men themselves: only better, since they were women), casa-se, muito jovem, com Clifford, Lord Chatterley, que, meses após o casamento, fica paralisado da cintura para baixo após uma lesão na guerra. Daqui surge o problema central ao livro, que eventualmente lhe dá um título: conseguirá Lady Chatterley ser feliz no seu casamento sem a intimidade física esperada do mesmo? Ser-lhe-á permitido procurá-la fora do casamento?

Antes de mais: o casamento deles parece desprovido de qualquer paixão, amor ou amizade. Embora o marido a idolatrasse de certa forma no início do casamento, não há qualquer ligação entre eles, parecem não ter nada em comum. Então, de certa forma, o facto de o marido estar paralisado parece-me meio irrelevante, porque ela estaria muito possivelmente insatisfeita com o seu casamento de qualquer das maneiras.

Clifford eventualmente sugere a Connie que esta pode ter um amante e ter uma criança, para dar um herdeiro e uma continuidade à linhagem e ao nome - o que é um bocadinho creepy vindo do próprio marido. Aqui Connie pensa em como há muitos mais peixes no mar:

There's lots of good fish in the sea... maybe... but the vast masses seem to be mackerel or herring, and if you're not mackerel or herring yourself, you are likely to find very few good fish in the sea.

E apesar disto, ela eventualmente envolve-se com Mellors, um empregado que cuida do gado. Alguém que não é de uma família nobre. Alguém que é casado, embora separado da mulher. Um homem que diz coisas como:

“Me? Oh, intellectually I believe in having a good heart, a chirpy penis, a lively intelligence, and the courage to say ‘shit!’ in front of a lady.”

Encantador.

Há aquela categoria de livros nos quais não acontece, objectivamente, nada. Este é um deles. É uma experiência bizarra de literatura porque, ao mesmo tempo que se lê como um clássico (aquela linguagem típica dos clássicos britânicos), tem realmente motivos para ir a tribunal por obscenidade: asneiras pelo meio, descrições relativamente gráficas de sexo, parecendo um daqueles livros trashy disfarçado de literatura.

Compreendo-o como literatura, mas é trashy na mesma. E é um livro importante por ter tocado, tão cedo, em tantos tópicos: ao ter incluído descrições sexuais gráficas antes de isso ser comum na literatura (embora houvesse já livros como o Fanny Hill), ao ter falado das várias necessidades numa relação amorosa, mesmo da parte de uma mulher - e especialmente da parte de uma mulher, algo que era raro na altura - e por ter como central um romance entre pessoas de classes distintas, numa relação que transcendia tais distinções.

3/5

Podem comprar uma nova edição aqui, ou em português aqui.

Comentários