Continuamos na luta e na labuta que é colocar publicações em dia. Quem tenha ouvido o podcast em 2023, decerto já me ouviu falar sobre este livro.
The Pumpkin Eater é um livro de 1962, que deu origem a um filme poucos anos depois, que eu nunca vi. É amplamente baseado na vida da própria autora, Penelope Mortimer, e no seu casamento com o também escritor John Mortimer, e parece ter sido uma experiência de escrita em busca de alguma catarse. Toca em temáticas como o casamento, a maternidade, a saúde mental e o papel da mulher na sociedade, e parece estar algo à frente do seu tempo, talvez também pela abertura com que fala de aborto.
À narradora, personagem principal, não conhecemos um nome próprio - conhecemo-la apenas pelo seu mais recente nome de casada, Mrs. Armitage. Já foi casada várias vezes (quatro), tem "vários" filhos (o que dá a entender que serão mais que quatro) dos vários casamentos, está grávida do marido (que lhe é infiel), uma criança que ele activamente não quer e lhe diz para não ter.
Mesmo os filhos que Mrs. Armitage foi tendo, dá a entender terem nascido porque ela não sabia muito bem o que fazer da vida, senão casar e procriar. Não lhes demonstra particular afecto, nem preocupação quando o marido manda os mais velhos (em número, novamente, indefinido) para um colégio privado. A forma como o texto está escrito parece íntima.
I don’t know who I am, I don’t know what I’m like, how can I know what I want? I only know that whether I’m good or bad, whether I’m a bitch or not, whether I’m strong or weak or contemptible or a bloody martyr – I mean whether I’m fat or thin, tall or short, because I don’t know – I want to be happy.
Os dilemas de Mrs. Armitage confrontam a imagem de perfeição que o marido quer transparecer ao público; o livro inicia com a sua ida a uma consulta com um psiquiatra. Apesar do conforto financeiro, graças ao grande sucesso do marido, Mrs Armitage sente um enorme desconforto psicológico, isolada, deprimida e frágil. Toda a sua vida foi dirigida por homens - o pai, os maridos - e, novamente, tudo o que ela soube fazer foi ter filhos. As traições do marido, é claro, não ajudam a esta crise existencial.
I imagined I'd have more time for Jake. But we all began to live alone, that's what really happened. We got men in to paint the rooms, and we didn't have to wash up any more, the children didn't come and grate cheese or make biscuits, in the evening they watched television, but not with us, and in the afternoons they went out for walks with the help. We drove about alone in our cars and we went away for holidays without Jake, because he was working.
Portanto, o que lhe resta fazer se não ter mais filhos? Mesmo com a falta de afecto e consideração que sente pelos que já tem (apenas uma das filhas, Dinah, tem direito a nome - os outros são um agregado de filhos), Mrs. Armitage sente-se seduzida pela ideia de ter mais um filho - como projecto de vida, de certo modo, como forma de ocupar o tempo - e, como disse acima, Jake está completamente contra.
Assim, Mrs. Armitage navega sem rumo pela sua vida, que nos é apresentada de forma pouco linear - os casos do marido, as consultas no psiquiatra, a sua juventude, tudo aquilo sobre o que ela não tem e nunca teve controlo.
John Mortimer também teve um caso, tendo engravidado outra mulher durante o casamento de ambos; Penelope Mortimer teve oito gravidezes e uma experiência semelhante à da sua narradora. Distingue-se de Mrs. Armitage, porém, porque esta nunca teve uma vida profissional, criativa, nunca foi mais que uma mãe, uma esposa, uma parte de um agregado ou uma peça decorativa num quadro familiar.
I began drinking because the thought that I was drinking gave me a kind of identity: each time I poured myself a brandy in the deserted afternoon I could say to myself ‘I am a woman who drinks.
4/5
Podem comprar uma outra edição na wook, não existe em português.
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