Após uma semana intensa de traduções, gripe, exame de sueco e outros eventos que tais que me impediram de me dedicar a um livro, regresso ao blog com um autor cujo nome eu conhecia associado à música - mas cuja obra musical desconheço.
Vinicius de Moraes é um nome incontornável do Brasil, mesmo para quem, como eu, vergonhosamente só o conhecia de nome.
Este é um livro de poesia, que é uma forma de escrita que, já admiti antes, compreendo mal e pouco, e conheço pouco também, o que me deixa pouco à vontade para comentar. Deixo-vos, portanto, com excertos vários de poemas vários deste livro, cuja variedade de temas e formas me surpreendeu muito.
(...)
Me pedes para te levar a comer uma salada
Mas de súbito me vem uma consciência estranha
Vejo-te como uma cabra pastando sobre mim
E odeio-te de ruminares assim a minha carne.
Então fico possesso, dou-te um murro na cara
Destruo-te a carótida a violentas dentadas
Ordenho-te até o sangue escorrer entre meu dedos
E te possuo assim, morta e desfigurada.
Depois arrependido choro sobre o teu corpo
E te enterro numa vala, minha pobre namorada...
Fujo mas me descobrem por um fio de cabelo
E seis meses depois morro na câmara de gás.
Sai, Câncer
Desaparece, parte, sai do mundo
Volta à galáxia onde fermentam
Os íncubos da vida, de que és
A forma inversa. Vai, foge do mundo
Monstruosa tarântula, hediondo
Caranguejo incolor, fétida anêmona
Carnívora! Sai, Câncer.
(...)
(...)
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
(...)
Definitivamente uma obra pequena mas interessante: não sabia o que esperar ao virar de cada página, fiquei sempre surpreendida, frequentemente pela positiva.
4/5
Podem comprar esta edição aqui.
(...)
Me pedes para te levar a comer uma salada
Mas de súbito me vem uma consciência estranha
Vejo-te como uma cabra pastando sobre mim
E odeio-te de ruminares assim a minha carne.
Então fico possesso, dou-te um murro na cara
Destruo-te a carótida a violentas dentadas
Ordenho-te até o sangue escorrer entre meu dedos
E te possuo assim, morta e desfigurada.
Depois arrependido choro sobre o teu corpo
E te enterro numa vala, minha pobre namorada...
Fujo mas me descobrem por um fio de cabelo
E seis meses depois morro na câmara de gás.
HISTÓRIA PASSIONAL, HOLLYWOOD, CALIFÓRNIA
Sai, Câncer
Desaparece, parte, sai do mundo
Volta à galáxia onde fermentam
Os íncubos da vida, de que és
A forma inversa. Vai, foge do mundo
Monstruosa tarântula, hediondo
Caranguejo incolor, fétida anêmona
Carnívora! Sai, Câncer.
(...)
SOB O TRÓPICO DE CÂNCER - I
(...)
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
(...)
O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO
Definitivamente uma obra pequena mas interessante: não sabia o que esperar ao virar de cada página, fiquei sempre surpreendida, frequentemente pela positiva.
4/5
Podem comprar esta edição aqui.
Comentários
Enviar um comentário