Quatro anos após Giovanni's Room, regressei a Baldwin.
Tinha ideia que (além do muito sofrimento, constante) Baldwin escreveu vários livros muito díspares. Go Tell it on the Mountain é de facto muito diferente de Giovanni's Room, diferindo deste no cenário, nos tipos de personagens, e naquilo que, vá, os faz sofrer.
1930s, Harlem. É o 14º aniversário de John Grimes, e este tem uma relação adolescente complexa com tudo o que o rodeia, nomeadamente a família e a religião - duas vertentes especialmente marcadas por o seu pai, Gabriel Grimes, ser um pastor pentecostal acérrimo e altamente autoritário. John tem muito na sua vida que o puxa para baixo, mas tenta sempre subir - a fé violenta do pai, mas também o racismo, a humilhação e a homofobia em seu redor, vs a sua ambição e inteligência, que podem dar-lhe alguma forma de escapar à cidade que o oprime.
Mas nenhuma opressão é maior que aquela da religião e da sua família, que se combinam na figura do pai; e a única forma de escapar ao inferno (o literal, que a vida lhe incute, e o figurado, cuja ideia a igreja lhe incute) é dar-se a Deus, desistindo de ambições, desejos, e de si próprio.
You in the Word or you ain’t - ain’t no halfway with God.
O livro está dividido em três partes - a primeira, que se centra um pouco em John, a segunda, com as preces e memórias dos seus pais, Gabriel e Elizabeth, e da sua tia, Florence, que revela mais da história da família: a mãe de Gabriel e de Florence, antiga escrava, tinha visto a maioria dos seus filhos serem vendidos, para nunca mais os ver; quando acabou a escravatura, recusou-se a sair do Sul. Mais tarde, Florence e, depois, Gabriel, fugiram para o Norte que representava a verdadeira liberdade, que não encontraram - haviam apenas perdido essa esperança.
E, no meio do desespero, há quem procure a igreja e há quem fuja dela. Gabriel, com um passado de pecado, veio a tornar-se pastor. Para ele, a verdadeira salvação é através da dor, da perda, da opressão, da vingança. Escolhe viver uma vida de culpa e de opressão, e espalhar esta mensagem pelos outros, impossível de racionalizar. E é assim que John fica sem poder, paralizado pelo medo, pela fúria, por visões da morte.
God was everywhere, terrible, the living God; and so high, the song said, you couldn't get over Him; so low you couldn't get under Him; so wide you couldn't get around Him; but must come in at the door.
Vi muita gente dizer que este livro é sobre questões raciais, religião ou sexualidade, mas não acho que seja sobre nenhum deles, embora todos estes sejam tópicos que permeiam o livro - a igreja é o local onde os vários personagens se encontram, a cor da pele é mais um factor de união entre todos, a sexualidade é apenas mais um ponto de conflito interno para John. Os personagens - as pessoas, em geral - são holísticos, somos todos a soma daquilo que faz de nós, nós, e não uma ou duas características. E no meio de tanta complexidade, vemos que os sentimentos dos personagens quanto às suas próprias vidas são ambíguos. A vida é complexa e cheia de nuances, somos humanos, somos imperfeitos.
Achei o final particularmente interessante por mostrar o rumo da vida de John como inevitável, não como um momento de alegria; como algo que iria acontecer porque foi para aí que ele foi conduzido, não obstante a sua relutância; a religião tem uma força enorme, na verdade (lembrei-me um pouco do final do Lord Marchmain em Brideshead Revisited).
Confesso ter-me sentido algo perdida nalgumas partes de referências religiosas e bíblicas mais específicas, algo que se pode explicar por eu ter uma educação religiosa que roça o nulo. Go Tell it on the Mountain é supostamente algo auto-biográfico, reflectindo algumas das dúvidas e experiências de James Baldwin na sua juventude.
4/5
Podem comprar uma outra edição em inglês na wook ou na Bertrand, ou em português, também na wook ou na Bertrand
Tenho aqui em casa para ler, será a minha estreia com James Baldwin. Parece ser um livro melancólico e introspectivo, preciso de estar no humor certo para enveredar por esse tipo de leitura :/
ResponderEliminarSim, da minha curta experiência, Baldwin não é de se abordar de ânimo leve :)
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