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Hamnet

Every life has its kernel, its hub, its epicentre, from which everything flows out, to which everything returns.



Hamnet é um livro que alguns saberão que li já há quase um ano; é assim que este blog anda e peço desculpa. Hamnet, mais que isso, é uma exploração da ligação entre Hamlet, a conhecida peça de Shakespeare, e a morte precoce do seu filho Hamnet, com 11 anos. E mais que isso, mais que uma história familiar, que uma ficção histórica, é um belíssimo e poderoso retrato de amor, sofrimento e luto, que Maggie O'Farrell escreveu com mestria.

Muito pouco é realmente conhecido sobre a vida de William Shakespeare (que, nesta obra, nunca é chamado pelo nome, mas por outros substantivos, o filho de John o luveiro, o jovem professor de latim, o escritor, o marido de Agnes, depois o pai de Susanna, Hamnet e Judith - quase sempre definido pelas suas relações familiares, pois a história é sobre a sua família) e Agnes/Anne Hathaway. Há, é claro, filmes que teorizam sobre um casamento infeliz; aqui, em intervalos intercalados entre o dia antes da morte de Hamnet, que é uma morte anunciada desde o início, e capítulos sobre a infância e a vida de Agnes, o casamento é retratado de outra forma, Agnes ganha personalidade, vida e força. 

She grows up feeling wrong, out of place, too dark, too tall, too unruly, too opinionated, too silent, too strange. She grows up with the awareness that she is merely tolerated, an irritant, useless, that she does not deserve love, that she will need to change herself substantially, crush herself down if she is to be married.

Já antes neste blog falei da minha frequente dificuldade a ler ficção histórica, especialmente quando envolve pessoas reais como personagens principais. Novamente, pouco se sabe sobre Agnes, e a história que Maggie O'Farrell lhe proporciona é cativante desde o início. Não é Shakespeare, aqui, o personagem principal - novamente, ele não tem nome e não lhe é dado esse protagonismo. E mesmo sendo Hamnet o título, não é o rapaz que sobressai na história, nem a peça que mais tarde Shakespeare viria a escrever. Desde cedo, parece ser a história de Agnes, a quem é dada uma família nuclear, a quem é atribuída uma infância quase retirada de um livro de fantasia, na floresta, com as plantas, a sua sensibilidade quase paranormal; passando depois para o seu casamento, a vida com os pais do marido, que ganha reconhecimento no mundo do teatro, e os anos que se passam até o evento central do livro, a morte de Hamnet.

It is to him she speaks in her disordered mind, not the trees, not the magic cross, not the patterns and markings of lichen, not even to her mother, who died while trying to give birth to a child. Please, she says to him, inside the chamber of her skull, please come back. I need you. Please. I should never have schemed to send you away. Make sure this child has safe passage; make sure it lives; make sure I survive to care for it. Let us both come through this. Please. Let me not die. Let me not end up cold and stiff in a bloodied bed.

E esta morte, não prevista por Agnes que parecia intuir e ter uma certa clarividência sobre tudo, traz uma descrição de luto, familiar mas acima de tudo materno (e vivido de forma solitária, dada a ausência do marido), tão profunda que parece palpável; a forma como o luto, não obstante partilhado, dificulta a ligação e o amor. E a partir do luto, Shakespeare cria um legado, através de Hamlet, num final belíssimo e extremamente bem conseguido.

Não é necessário ter lido Shakespeare, ser particularmente conhecedor da sua obra ou do pouco que se sabe da sua vida para apreciar Hamnet. É um livro muito bem escrito, com passagens lindíssimas, uma morte anunciada mas mesmo assim rodeada de tensão, personagens bem desenvolvidos e uma narrativa fresca sobre a vida familiar de um dos nomes mais conhecidos da literatura.

She discovers that it is possible to cry all day and all night. That there are many different ways to cry: the sudden outpouring of tears, the deep, racking sobs, the soundless and endless leaking of water from the eyes. That sore skin around the eyes may be treated with oil infused with a tincture of eyebright and chamomile. That it is possible to comfort your daughters with assurances about places in Heaven and eternal joy and how they may all be reunited after death and how he will be waiting for them, while not believing any of it. That people don’t always know what to say to a woman whose child has died. That some will cross the street to avoid her merely because of this. That people not considered to be good friends will come, without warning, to the fore, will leave bread and cakes on your sill, will say a kind and apt word to you after church, will ruffle Judith’s hair and pinch her wan cheek.

5/5

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