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Fun Home

Mais um clássico ao qual cheguei tardiamente.



Fun Home, de Alison Bechdel (nome que já me era muito familiar devido ao teste), é uma memória que funciona de várias maneiras: enquanto história de crescimento, de descoberta da sexualidade, mas também de desconstrução e reconstrução da memória do pai de Alison Bechdel, e da relação que ela tinha com este.

Alison Bechdel relata, em sete capítulos, aquela que não terá sido a infância mais feliz, com um pai que tinha herdado (e exercia em part-time) um negócio de funerais (daí o título, irónico de várias maneiras), também era professor de inglês, e vivia para restaurar a mansão vitoriana decrépita em que se inseria o negócio e na qual Alison cresceu com os pais e os irmãos, sendo as crianças frequentemente obrigadas a ajudar na casa funerária. Caso a ideia de crescer numa mansão assim, numa casa funerária, não fosse inconvencional o suficiente, o pai de Alison, perfeccionista, excêntrico, pouco afável com a família, era secretamente homossxeual e tinha relações problemáticas com rapazes demasiado jovens.

Embora o início do livro me tenha prendido pouco, rapidamente Bechdel consegue criar uma narrativa empática, especialmente nos pontos em que se sente a convergir com alguns dos interesses e ideias do pai. A mãe, apenas pano de fundo (mas material de inspiração para um outro livro da autora), está visivelmente infeliz, e Alison, à medida que cresce, tem de encarar e compreender a sua própria sexualidade.



Após uma infância com alguns, poucos momentos felizes, e muitos momentos de não estar ao nível dos requisitos do pai, fossem em termos de decoração, roupa ou limpeza (áreas pelas quais ele era obcecado), Alison vai para a faculdade e descobre ser lésbica. Pouco depois de o revelar aos pais, descobre, de forma algo abrupta, que o pai é homossexual; e pouco depois desta descoberta, o pai morre, deixando para trás um legado de confusão e mistério e uma identidade que ninguém da sua família próxima conhecia.

O texto está repleto de referências literárias e, na sua simplicidade, transmite muitas emoções de forma honesta, dando a entender que, enquanto Alison escrevia esta obra, estava a tentar "colocar no papel" as suas vivências, de modo a compreender, encaixar e processar melhor as peças da sua memória, sendo que também o final deixa a entender que este é um trabalho ainda em andamento, de luto por um pai que, inicialmente um enigma, vem a descobrir que nunca conheceu verdadeiramente, e de tentativa de aceitar melhor a infância e a família.

Fun Home parece um esforço de uma mulher para compreender melhor o pai, a sua vida, morte e personalidade, ao mesmo tempo que tenta assimilar o desconforto que sentia consigo própria enquanto crescia, o medo de assumir quem realmente era, comparando a sua experiência com a de um homem que nunca o pôde fazer. Altamente recomendado.

5/5

Podem comprar esta edição na wook ou na Bertrand; actualmente esgotado em português, mas talvez nas bibliotecas.


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