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The Mad Women's Ball

Li este livro através do NetGalley, em advanced copy (daí a advertência na capa).



A descrição, desde logo, intrigou-me: faço parte dos muitos que têm uma curiosidade algo mórbida quanto à história dos asilos de saúde mental, além de que Salpêtrière do fim do séc. XIX também diz muito sobre a história das mulheres, em França, mas também na Europa. Assim, e mesmo não sendo ficção histórica o género em que mais me aventure, e juntando a estes factores os prémios e atenção que recebeu em França, o livro captou a minha atenção e decidi dar-lhe uma hipótese.


O ano é 1885, e aproxima-se o grande evento: o bal des folles, um baile para o qual eram convidados homens da burguesia e alta sociedade parisiense, no qual poderiam conhecer e conviver com várias das pacientes do Hôpital de Salpêtrière. Parece ficção, mas estes bailes de máscaras aconteciam mesmo, com o mais alto patrocínio do famoso Dr. Charcot (inegável figura da história da neurologia e psiquiatria de Salpêtrière, que tem, é claro, o seu papel no livro, bem como um dos seus discípulos, Babinski), e são-nos aqui apresentados como o ponto alto do ano para as mulheres cujas vidas se desenrolavam dentro das paredes do hospital, a noite em que poderiam experimentar alguma sensação de normalidade nas suas vidas.


Every year, the excitement is the same. The Lenten Ball - or 'the Madwomen's Ball', as the Parisian bourgeoisie called it - is the highlight of March, the highlight of the year. In the weeks that precede it, no one can think of anything else. The women begin to dream of gowns and finery, of orchestras and waltzes, of twinkling lights, furtive glances, swelling hearts and applause (...)


Mas Dr. Charcot e o próprio baile servem apenas de enquadramento geral para a narrativa. As quatro mulheres principais desta história (Geneviève, Louise, Thérèse, Eugénie) contam-nos algo sobre o que seria a vida das mulheres não só em França, mas na Europa em geral, no final do séc. XIX: como aquelas que saiam da norma, do papel que lhes tinha sido atribuído e designado pela sociedade (pelos homens) eram, frequentemente, apodadas como loucas, doentes, alienadas e internadas num hospício, do qual não tinham grandes possibilidades de sair e no qual eram esquecidas. Mulheres que tentavam recuperar a sua dignidade, que queriam levar as suas vidas e testar as suas capacidades além do que lhes era possibilitado, que eram vítimas de violência.


Sleep makes it possible not to fret over what is past, not to worry about what is to come. Sleep has been her only respite since the events of three year ago that led her to be in this place.


A "histeria", esse grande mal feminino que era, somente, querer mais do que a sociedade dava, é desconstruída pela autora, Victoria Mas, que mostra o profundo desequilíbrio social entre homens e mulheres, tornando muito fácil que estas fossem declaradas mentalmente doentes e sujeitas a práticas questionáveis em nome da medicina, tornando as alegadas doentes mentais em protagonistas de um espectáculo quase circense, sem humanidade ou dignidade ou protecção. E, no entanto, para muitas, a vida dentro de uma instituição como o Hôpital de Salpêtrière era um melhor prospecto que regressar ao mundo lá fora.


Dr Charcot gave another public demonstration today. Young Louise was his subject once again. The poor girl imagines she is already as famous as Augustine. Perhaps I should remind her that Augustine so enjoyed the success that she ran away from the hospital - and dressed in men's clothing, no less!


The Mad Women's Ball é um livro que, pelo contexto que apresenta (o lugar físico, cuja história é brevemente explorada, o tratamento da saúde mental, mas também o questionar do lugar das mulheres na sociedade francesa do final do séc. XIX), promete uma história fantástica, mas que acaba por não a concretizar. O livro prende, sim, e fascina, mas peca pela narrativa limitada e com uma conclusão algo abrupta e insatisfatória.


4/5


Ainda só está disponível em francês, mas até lá (a tradução para inglês deve sair no verão) podem aproveitar no NetGalley



Comentários

  1. Também gosto muito de mad women, fechadas no quarto, no sótão, em asilos...
    No outro dia, li To Room 19 da Doris Lessing e, caramba, fenomenal! Estou desejosa que publiquem em PT La Madre de Frankenstein da Almudena Grandes, que a Ana Lopes elogia imenso, porque é uma louca daquelas carismáticas mesmo. E trouxe da BLX aquele que montes de gente anda a ler, Coisas de Loucos, da Catarina Gomes. Espero que seja bom!
    Paula

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    Respostas
    1. não será por acaso que prefiro o wide sargasso sea ao jane eyre ;)
      não conheço nem esse da lessing (que, confesso, é uma autora que ainda não li, embora habite na estante), nem esse da almudena (idem...). o da catarina gomes conheço de nome e também me desperta curiosidade!

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