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Roughneck

A minha estreia com Lemire-ilustrador.


Que, para mim, veio cimentar o enorme talento que eu já lhe reconhecia. Na cidade fictícia de Pimitamon, no frio e escuro Canadá, encontramos Derek Ouellette, um antigo jogador de hockey "caído em desgraça" e, acima de tudo, cheio de traumas. Derek é violento - algo que descobrimos logo no prefácio, até porque foi a sua violência excessiva que pôs um fim forçado à sua carreira; aquilo que não sabemos é que esta é uma história de redenção, coragem e perda.

Derek Ouellette está a tentar colocar a sua vida nos eixos, com muita dificuldade; tem um emprego num restaurante, como cozinheiro, e está sempre a meter-se em confusão, por mais que os amigos o tentem proteger e resguardar. Muitos dos seus traumas, tenta afogar em álcool. Sendo Derek um tipo duro, o álcool não traz ao de cima exactamente aquilo que ele tem de melhor... e as coisas conseguem piorar quando Bethy, a sua irmã há muito desaparecida, aparece sem avisar.

E se achamos que Derek está no fundo do poço, Beth não está melhor: viciada em opioides, a fugir de um ex-namorado violento e com passado criminoso... Juntos, os irmãos vão enfrentar os seus fantasmas, o seu passado de violência e de solidão. Os seus traumas.

 

A vida é difícil nesta small town canadiana - alcoól, drogas, violência. A violência enquanto ciclo vicioso, que passa de pais para filhos, que parece inelutável, que quase se torna numa zona de conforto para quem não conhece uma alternativa. Assim, Roughneck é sobre as escolhas que se fazem, o que nos levam a fazer, como tudo está relacionado e tudo tem consequências. E a altura de enfrentar as consequências, inevitavelmente, chega.

Um ponto que se destaca nesta obra é, para mim, a questão dos indígenas canadianos - não só alguns dos seus hábitos, que vão sendo demonstrados, mas também a forma como foram retirados das suas comunidades nativas, forçados a integrar-se num mundo e numa realidade demasiado afastados dos seus. Foi isto que aconteceu à mãe de Derek e Bethy, por exemplo - tanto Derek como Bethy são meio First Nation, e talvez a violência infligida sobre a mãe deles seja, assim, anterior ao casamento. A violência familiar perpétua torna-se no cicatrizar de feridas emocionais.

 

O final fica em aberto, cabendo o desfecho à interpretação do leitor, o que o torna ainda mais belo. Facilmente das melhores leituras do ano.

As cores surgem apenas para os flashbacks, nem sempre felizes, sendo o presente tão árido, isolado e frio quanto a cidade e a narrativa que nos apresentam, a preto, branco, cinzento e tons de azul. A arte é fluída, há muitos painéis sem texto, em que a arte fala por si - a falta de narração ou diálogo funciona, porque tudo nos é dado na medida certa. Encaixa perfeitamente na narrativa e torna tudo mais real.

E há um cão. Que pode ser simplesmente um cão, ou representar algo mais.

5/5

Podem comprar esta edição directamente à editora.

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