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the princess saves herself in this one

Vamos falar de poesia de internet.



Mais que certo e sabido que não sou leitora habitual de poesia. Este era um livro que me despertava vago interesse por alegadamente ter conteúdo feminista e de empowerment (vede o título); interesse esse vago o suficiente para eu nunca o ter adquirido e não ter a certeza se o queria ter na estante. Portanto, e dado que a última experiência correu bem, apostei na leitura digital. Novamente, pareceu ser uma boa aposta: poucas palavras por página, mancha de texto limpa, por que não?


"1. fill in the blank: a) poetry is ______ - anything you want it to be"


Será mesmo? Gosto de alguns dos sentimentos do livro, de ideias feministas aqui pautadas, das emoções cruas, é certo - mas o conteúdo tem índole tão pessoal que me lembra dos idos tempos do LiveJournal e de confidenciar coisas tristes e momentos depressivos adolescentes a desconhecidos e tentar ter estilo, de ter 13 anos e escrever poemas e pensamentos soltos horrorosos que ainda bem que foi tudo para a reciclagem... consta que Amanda Lovelace escrevia estes pensamentos (poderão ser mais do que isso?) no Tumblr e se tornou popular à conta disso. Consigo perceber como. São fragmentos que podem chamar à atenção num meio como o digital.


Não funcionam enquanto livro - são frases com má pontuação, carregar no enter entre palavras, e parecem interessantes. Alguns parecem interessantes, aliás; outros parecem forçados e, num todo, é exaustivo. É poesia de scroll down, para ler casualmente na internet no meio de tanto outro conteúdo.


A falta de estrutura e conteúdo lembram o livro de Rupi Kaur, Milk and Honey, que li há uns anos e do qual gostei bastante. Na minha memória, esse foi muito mais sólido do que the princess saves herself in this one, mas levanta a questão: gostaria de Rupi Kaur numa releitura? A verdade é que este livro não me trouxe nada de novo, é genérico, é emo angst, é um conjunto de lugares-comuns, que se calhar funcionam para tanta gente precisamente por isso: por serem clichés.


E no entanto, foi talvez por isso que se tornou difícil (para mim! Percebo que funcione para muita gente) ligar-me ao livro. A abordagem de sentimentos pessoais - como luto, por exemplo! - está enterrada em clichés, distante, sem qualquer profundidade. Houve momentos dos quais eu poderia quase ter gostado, mas o "estilo" (como quem diz, carregar no enter a cada duas palavras) arruinou frequentemente a experiência.


where

do all the

memories go,

the ones we

hide away

with

lock &

key yet

continue

to shape

us all the

s a m e?


- did it really happen if i can't remember it?


(que raio é isto???)


Foi incluído nalguns artigos da FNAC, nomeadamente "8 livros feministas do século XXI que todos devem ler" (discutível, mas a verdade é que não li nenhum dos listados) e "5 livros que reinventam o conceito de poesia" (possivelmente pela tecla enter).


Pela falta de substância, de estilo, por não me prender também, acabei por folhear (digitalmente!) este livro num instante, passando página atrás de página. Não me arrependo de o ter lido (até por não me ter tomado tanto tempo assim), mas fico feliz por não estar a ocupar lugar na estante.


1,5/5


Podem comprar em formato físico na wook, na Book Depository ou na Bertrand, ou em português na wook ou na Bertrand


Comentários

  1. Já o li, há cerca de um ano e também não gostei, particularmente.
    Li e ouvi recentemente o Milk and Honey e fiquei com a mesma situação. Quase tudo é uma frase gira para um poster motivacional, mas pouco mais.
    Ainda assim, no caso da Rupi Kaur o "sumo" está lá.

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    1. é... algumas páginas achei engraçadas, outras deixaram-me com uma sensação de "pronto, está bem", e outras para mim foram mesmo parvas. giras para um scroll down na internet.
      a rupi, à data em que li, pareceu-me melhor - terá sido da altura em que o li? -, pelo menos um bocadinho menos básico, mas a verdade é que também não me deixou com curiosidade para ler mais dela...

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  2. A cota que eu sou às vezes vem à tona, mas acho que essa lista de livros feministas e este tipo de poesia se destina a gente bem mais nova que eu. Também têm espaço, mas parece-me tudo muito pueril. "Se já leste Simone de Beauvoir, vai ler Chimamanda." Poupem-me, parece-me que é ao contrário...
    Acho importante esta poesia existir, pelas razões que a Sara apontou no último post, mas não é de todo para mim. É a poesia do enter, como muito bem dizes. Como dizia uma amiga minha do Goodreads, é uma poesia que te diz o que sentir, que te faz a papinha toda, em vez de tirarmos nós as nossas próprias conclusões e emoções.
    Paula

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    1. Eu acho que, se tivesse menos uns 10 a 15 anos em cima, poderia ter gostado (possivelmente uma trintona como eu não é mais o público alvo destes livros), teria sido mais "relatable" talvez... aprecio os sentimentos, mas não me diz nada porque é tudo muito superficial e vazio. Toca efectivamente em temas menos comuns, de forma mais clara e directa que a poesia "tradicional" ou "normal", e possivelmente é mais acessível para muitos do que Sylvia Plath, por exemplo. E, se calhar, muita gente vai ler isto e vai querer começar a ler mais, vai ter maior curiosidade por poesia, ou pela leitura, e isso é positivo, mas se calhar sou eu que já tenho muita bagagem e isto não me traz nada :)

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  3. Cold-blooded
    Dos 8 livros feministas do século XXI que todos devem ler, sugeridos pela fnac, pretendes ler algum? A mesma questão para os 5 livros que reinventam o conceito de poesia, se bem que aqui tenho um feeling de qual será a resposta

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    1. os de poesia não, já dos outros oito, tenho muita curiosidade com o da carmen maria machado e eventualmente pelo das raparigas rebeldes

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