Esta é uma review muito especial.
O motivo é simples: o livro foi-me dado e recomendado pessoalmente pela neta do autor, a Inês. Foi a minha primeira experiência a ler Urbano Tavares Rodrigues, sendo este um livro curto, e dos últimos que escreveu numa longa carreira literária (cerca de 60 anos).
O Eterno Efémero desenrola-se em torno de um crime, o homicídio do influente Miguel Ruiz Fernandes. Os suspeitos são cinco: quatro mulheres e um homem, que com Miguel Ruiz Fernandes participavam de orgias e jogos sado-masoquistas.
A investigação é entregue ao inspector Moura Prata, que acaba por tomar interesse pessoal pelas mulheres integrantes do grupo. Sandra fora a primeira a conhecer Miguel, num chat na internet; posteriormente, apresentara-lhe três das suas colegas de trabalho, todas elas engenheiras. Três das mulheres (incluindo Sandra eram casadas, e começaram por apreciar o que Miguel Ruiz Fernandes tinha para lhes oferecer; rapidamente, as quatro tinham-se tornado escravas sexuais, mediante chantagem que as mantinha submissas.
O outro homem do grupo era Leopoldo Fialho.
Que asco sinto por este tipo de homem. Mas não podia ir mais longe do que espicaçá-lo, a minha posição não o permite.
(...) Ainda hoje não suporto gente demasiado bem vestida ou mal vestida com finura. Nem a pompa nem a jactância de ofício de certos figurões dos Ministérios e da Assembleia da República. Sou um legalista e é claro que voto sempre, mas não morro de amores pelos partidos e menos ainda pelos de direita. Diante de um palhaço rico como este, descubro que tenho afinal sentimento de classe.
Porque Leopoldo era também alentejano, como o inspector, mas burguês, da aristocracia rural, e é um homem que não trabalha, que vive de rendimentos, que, no grupo, era apenas o cúmplice do outro - e, ainda assim, conseguira despertar a paixão de uma das mulheres, Dora Marina.
As mulheres são todas diferentes entre si, e as mais velhas acabam por relegar a Cátia o papel de "vítima" dos jogos mais violentos ou mais complicados, do prazer que Miguel Ruiz retirava às custas delas, mas também do amigo, de forma maldosa e cruel. Aos poucos, o inspector compreende o que as levou a embrenhar-se naquela teia: a fuga ao marasmo do casamento, a aventura. E como, com a violência cada vez maior de cada encontro, todas tinham começado a odiar Miguel, o que fazia com que qualquer uma pudesse ser a assassina.
Paralelamente, entre capítulos, o autor apresenta crónicas sociais e quotidianas, sem qualquer ligação com a narrativa principal e com personagens que não voltam a aparecer, situações mundanas que podem ocorrer ao mesmo tempo que um crime absurdo, que qualquer outra preocupação.
A gente da cidade que ainda não foi para o Algarve, ou não tem já dinheiro para férias, despeja-se aos fins de semana na Costa da Caparica. Muitos gastam o que podem e o que não podem.
Há quem procure o Jardim das Plantas ou a Tapada da Ajuda, onde encontra capelas vegetais e uns vestígios de frescura. No seio do calor sonha o peso dos desejos entre sonos irregulares.
É uma crítica a uma sociedade conservadora, abordando os encontros e o sexo iniciados online, através de uma estranha relação entre seis indivíduos. É parte mistério (embora o lado policial da obra não seja o principal), parte reflexão sobre as complexas relações humanas, sobre motivações pessoais e o quotidiano.
Apesar de tudo isto, é um livro curto - e, ainda assim, nada fica para dizer, pois o mistério é de facto resolvido, e o inspector acaba por criar interacções com os suspeitos que levam a narrativa mais longe. A escrita é belíssima e envolvente, focando não só nas grandes, mas também nas pequenas coisas da vida.
4/5
O Eterno Efémero desenrola-se em torno de um crime, o homicídio do influente Miguel Ruiz Fernandes. Os suspeitos são cinco: quatro mulheres e um homem, que com Miguel Ruiz Fernandes participavam de orgias e jogos sado-masoquistas.
A investigação é entregue ao inspector Moura Prata, que acaba por tomar interesse pessoal pelas mulheres integrantes do grupo. Sandra fora a primeira a conhecer Miguel, num chat na internet; posteriormente, apresentara-lhe três das suas colegas de trabalho, todas elas engenheiras. Três das mulheres (incluindo Sandra eram casadas, e começaram por apreciar o que Miguel Ruiz Fernandes tinha para lhes oferecer; rapidamente, as quatro tinham-se tornado escravas sexuais, mediante chantagem que as mantinha submissas.
O outro homem do grupo era Leopoldo Fialho.
Que asco sinto por este tipo de homem. Mas não podia ir mais longe do que espicaçá-lo, a minha posição não o permite.
(...) Ainda hoje não suporto gente demasiado bem vestida ou mal vestida com finura. Nem a pompa nem a jactância de ofício de certos figurões dos Ministérios e da Assembleia da República. Sou um legalista e é claro que voto sempre, mas não morro de amores pelos partidos e menos ainda pelos de direita. Diante de um palhaço rico como este, descubro que tenho afinal sentimento de classe.
Porque Leopoldo era também alentejano, como o inspector, mas burguês, da aristocracia rural, e é um homem que não trabalha, que vive de rendimentos, que, no grupo, era apenas o cúmplice do outro - e, ainda assim, conseguira despertar a paixão de uma das mulheres, Dora Marina.
As mulheres são todas diferentes entre si, e as mais velhas acabam por relegar a Cátia o papel de "vítima" dos jogos mais violentos ou mais complicados, do prazer que Miguel Ruiz retirava às custas delas, mas também do amigo, de forma maldosa e cruel. Aos poucos, o inspector compreende o que as levou a embrenhar-se naquela teia: a fuga ao marasmo do casamento, a aventura. E como, com a violência cada vez maior de cada encontro, todas tinham começado a odiar Miguel, o que fazia com que qualquer uma pudesse ser a assassina.
Paralelamente, entre capítulos, o autor apresenta crónicas sociais e quotidianas, sem qualquer ligação com a narrativa principal e com personagens que não voltam a aparecer, situações mundanas que podem ocorrer ao mesmo tempo que um crime absurdo, que qualquer outra preocupação.
A gente da cidade que ainda não foi para o Algarve, ou não tem já dinheiro para férias, despeja-se aos fins de semana na Costa da Caparica. Muitos gastam o que podem e o que não podem.
Há quem procure o Jardim das Plantas ou a Tapada da Ajuda, onde encontra capelas vegetais e uns vestígios de frescura. No seio do calor sonha o peso dos desejos entre sonos irregulares.
É uma crítica a uma sociedade conservadora, abordando os encontros e o sexo iniciados online, através de uma estranha relação entre seis indivíduos. É parte mistério (embora o lado policial da obra não seja o principal), parte reflexão sobre as complexas relações humanas, sobre motivações pessoais e o quotidiano.
Apesar de tudo isto, é um livro curto - e, ainda assim, nada fica para dizer, pois o mistério é de facto resolvido, e o inspector acaba por criar interacções com os suspeitos que levam a narrativa mais longe. A escrita é belíssima e envolvente, focando não só nas grandes, mas também nas pequenas coisas da vida.
4/5
Podem comprar esta edição aqui.
E mais uma daquelas capas tão bonitas!
ResponderEliminarFico muito optimista com esta tua estreia tão auspiciosa. Conto ler a primeira novela dele em maio, quando já não parece haver projetos literários em vista. Este mês está a ser uma lufa-lufa! Vai ser o meu projeto pessoal de ler livros oferecidos, visto que também ganhei um livro que queria muito ler do Joel Neto num sorteio da Ana Lopes.
Paula
Lindíssimas, estas edições! Este foi-me pessoalmente recomendado pela Inês :) é uma das últimas obras do autor, e bastante curta.
EliminarTambém quero, em Maio, ler livros oferecidos que ficaram meses (ou anos...) em stand-by :)
Muito boa estreia - a abrir caminho para a minha, que quero muito que seja tão boa como a tua! Não sei quando lerei o livro que tu, muito gentilmente me ofereceste, mas quero ver se o faço este ano! Depois conto-te tudinho!
ResponderEliminarObrigada mais uma vez!
Quererei saber tudo, Ana! Espero mesmo que gostes :) enorme beijinho!
Eliminar