Um manifesto que, na verdade, é um conjunto de duas palestras dadas por Mary Beard: The Public Voice of Women, de 2014, e Women in Power, em 2017.
De um ponto de vista académico, Mary Beard faz a ponte da voz dominante dos homens (que oprime a das mulheres) dos tempos de hoje até à literatura clássica grega e romana, a sua especialidade, argumentando que desde a antiguidade clássica, as mulheres têm sido marginalizadas e silenciadas. Sou entusiasta dos clássicos gregos e romanos, mas confesso nunca ter lido a Ilíada, e apenas excertos que me aborreceram muito da Odisseia (em minha talvez defesa, tinha 12 anos), e é fascinante encontrar neles algumas raízes da retirada do poder e do silenciamento das mulheres.
You cannot easily fit women into a structure that is already coded as male; you have to change the structure.
Como é que os mitos e crenças antigas, ancorados na misoginia, ainda hoje se reflectem no pensamento comum? Como é que as ameaças na internet se tornaram uma resposta comum a mulheres que demonstrem alguma iniciativa e visibilidade? Mary Beard pega em pequenos detalhes, mas, no conjunto, acabam por ser representativos da forma de pensar que parece ser inerente na sociedade actual, não obstante o tempo passado - como o poder é associado a ideias de masculinidade, como as mulheres que tomam o poder se tentam apoderar desta masculinidade (roupa, forma de falar...) - não apresenta soluções, mas pede-nos que olhemos para relação entre mulheres, vida pública e poder.
Esta leitura fornece uma luz interessante sobre as noções culturais que temos de inferioridade das mulheres, e tem muita informação em poucas páginas. Claro, conciso e bem escrito, vale muito a pena, especialmente, por abrir caminho a novas reflexões e novas ideias.
We have to be more reflective about what power is, what it is for, and how it is measured. To put it another way, if women are not perceived to be fully within the structures of power, surely it is power that we need to redefine rather than women?
Temos, sim, de olhar e reflectir para o poder, pensar no seu significado e no peso que este tem. Ganhamos todos, em colectivo, se permitirmos que mulheres acedam ao poder, sem as vermos através de estereótipos arcaicos - se redefinirmos o conceito de poder, e não perpetuarmos a forma como as mulheres se adaptam a ele.
5/5
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Gostei deste ensaio, mas achei tão curtinho. Apontou os problemas, mas sinto que faltava a parte das soluções, sabes? Ainda assim, concordo que é leitura essencial.
ResponderEliminarsim, entendo isso, mas acho que "oferecer" sugestões pode parecer preachy; assim, dá espaço para reflexão, e abre caminho para várias soluções :) gostei!
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