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My Sister, My Love

A minha primeira leitura de Joyce Carol Oates.


A minha ideia da obra da autora é que, também devido à sua carreira ridiculamente prolífica, a par de livros verdadeiramente bons, alguns dos outros são medíocres na melhor das hipóteses. Tenho alguns dos seus títulos em casa, há vários anos, e decidi debruçar-me primeiro num cuja temática me fascinava.

Joyce Carol Oates é conhecida por fazer algumas obras que são, digamos, ficções disfarçadas - narrativas nas quais pega, de algum modo, pessoa real, conhecida por algum motivo, e dá uma história alternativa a uma história real. Escreveu Blonde, sobre Marylin Monroe, Zombie, sobre Jeffrey Dahmer e, em My Sister, My Love, escreve, inegavelmente e de forma indirecta, sobre JonBenét Ramsey.

Embora não seja pessoa de ler true crime, é algo que me fascina. E foi esse fascínio que me levou a este livro sobre uma família suburbana disfuncional, narrada por Skyler Rampike, irmão de uma criança prodígio da patinagem no gelo que apareceu morta de forma violenta em casa aos, sensivelmente, sete anos, num homicídio ainda por resolver.

I've made myself begin whatever this will be, some kind of personal document - a "unique personal document" - not a mere memoir but (maybe) a confession. (Since in some quarters, Skyler Rampyke is a murder suspect you'd think I have plenty to confess,wouldn't you?) Fittingly, this document will not be chronological/linear but will follow a pathway of free association organized by an unswerving (if undetectable) interior logic: unliterary, unpretentious, disarmingly crude-amateur, guilt-ridden, appropriate to the "survivor" who abandoned his six-year-old sister to her "fate" sometime in the "wee hours" of January 29, 1997, in our home in Fair Hills, New Jersey. Yes, I am that Rampike.

Skyler, o filho mais velho que rapidamente é preterido pela irmã mais nova, Bliss (nascida Edna Louise, mas não era um nome sonante o suficiente). O pai queria o filho atlético, motivo de orgulho; no esforço, Skyler lesionou-se gravemente e Bix, o pai, deixou de conseguir relacionar-se com ele. Quando Bliss demonstra um talento inato para a patinagem, todas as atenções se viram para ela - que se torna, até, veículo de reparação do casamento de Betsey e Bix.

How without families must envy us who bask in parental love, in the glow of yule-logs burning in fireplaces stoked by our daddie's robust pokers, we who are stuffed to bursting with our mummie's frantic holiday cooking; how you wish you could be us, pampered/protected kids tearing expensive foil wrappings off too many packages to count, gathered about the Christmas tree on Christmas morning as Mummy gently chided: "Skyler! Bliss! Show Daddy and Mummy what you’ve just opened, please! And save the little cards, so you know who gave such nice things to you".

A narrativa é fascinante, triste e tortuosa. Skyler é um personagem desesperado, solitário, e todo o livro reflecte uma crítica social sobre a falta de auto-estima dos adultos que os leva a viver o sucesso dos filhos como seu próprio símbolo e estatuto, as suas consequências desastrosas e os danos causados ainda que inconscientemente, tudo com um sentido de humor corrosivo.

Skyler conta a sua história dez anos após o homicídio da irmã, tentando reconstruir a sua vida antes de a irmã nascer, durante o breve auge da sua fama e depois da sua morte. Toda a sua vida desde a fama da irmã era em função dela - o que piorou ainda mais depois do homicídio. 

Jon-Benét Ramsey não patinava, mas era a estrela de vários concursos de beleza e modelos infantis, levando a família a uma espécie de fama que escalou rapidamente com o homicídio da criança, ainda por resolver, entre contornos bizarros como a falta de sinais de invasão de domicílio e uma nota de resgate incoerente (ambos detalhes aproveitados neste livro). Hoje, quase duas décadas volvidas, o homicídio continua por resolver - sendo que Burke, irmão mais velho, foi apontado como suspeito.

Também o de Bliss não tem solução oficial, embora Skyler viva toldado pela culpa que não sabe por que sente. Apesar de criança, é tornado suspeito, mais que os pais e que um stalker/admirador de Bliss; a família desintegra-se e Skyler é remetido para hospitais psiquiátricos e outros tipos de instituições para jovens não integrados. A sua saúde mental colapsa por motivos óbvios, acrescidos pelo distanciamento a que os pais o remetem, de forma ignorante, insensível e egoísta.

A forma como os Rampikes pais falam - os erros, as palavras mal utilizadas, as ameaças disfarçadas - dizem mais sobre eles do que eles gostariam; da forma como Skyler os apresenta, não parecem ter características redentoras, mas sabemos, desde o início, não estar perante um narrador credível. Em quem acreditamos, afinal, nesta história?

4/5

Esgotado em ambas as edições em inglês na wook e na Bertrand; mas acredito que encontrem em lojas diferentes. Nunca traduzido para português.


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