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A mostrar mensagens com a etiqueta short stories

El matrimonio de los peces rojos

O meu primeiro encontro com a obra de Guadalupe Nettel (cujo La hija única  foi super popular no ano passado, quando cá saiu) foi com El matrimonio de los peces rojos , um conjunto de contos. Este é um conjunto de cinco contos curtos, nos quais os problemas e dilemas dos personagens humanos se vêem espelhados nas vidas e problemas de criaturas várias nas suas vidas - gatos, cobras, peixes (como no título), baratas e até mesmo fungos. É um conceito que pode soar bizarro, mas que Guadalupe Nettel faz funcionar bem - e que explora também em La hija única , dessa feita com pássaros. Os contos são multidimensionais, apesar da curta dimensão, e são histórias credíveis, humanas. Cada um funciona individualmente, mas como conjunto funcionam muito bem, complementam-se entre si, parecendo quase variações do mesmo tema, com abordagens e animais (organismos?) diferentes. Los momentos decisivos de la vida - el nacimiento, la conquista de la madurez, el apareamiento y la reproducción, la enferme...

Amok - suivi de Lettre d'une Inconnue

Em que circunstâncias leva o amor à loucura? Muitos poder-se-ão perguntar por que motivo decidi ler Stefan Zweig, autor austríaco, em francês. Retirando logo essa questão do caminho: tinha a ideia de que as traduções para francês são muito boas. Adianto já que não me arrependi. Estas edições da Livre de Poche são também muito bem prefaciadas, explicando aqui também o porquê de se terem juntado, neste pequeno volume, estes três contos/ novellas : a temática do amor enquanto força irresistível e destruidora que não difere muito da loucura, de várias maneiras. Zweig foi um autor muito prolífico e juntar tematicamente a sua obra parece-me um feito interessante. Amok achei muito interessante - é um conceito malaio e a obra de Zweig levou, no fundo, à ocidentalização da ideia. É a história de um médico que acaba por enlouquecer, isolado nos trópicos, com elevada carência de contacto humano, que acaba por permitir que as suas emoções se sobreponham à razão. É uma novella  curta, mas fort...

Mr Salary

A minha estreia com a muito aclamada Sally Rooney foi esta Faber Story . (aqui está uma capa que, com o p&b do kobo, não se destaca nada)  Já tinha lido um dos contos publicados pela Faber ( o da Sylvia Plath, claro ); também há um conto da Lorrie Moore que me atrai, mas tenho o  Anagrams  na estante há anos. Decidi, portanto, estrear-me com esta autora através da sua ficção curta. Muito disto foi por ter vastas dúvidas sobre o quão aprazível me será a sua obra, confesso - e muitas das dúvidas, poucas páginas volvidas, permanecem. Mr Salary  é sobre Sukie, uma rapariga com 24 anos, que tem uma relação complexa com Nathan, irmão de uma tia sua, 15 anos mais velho, que a acolheu enquanto ela estudava, jovem adulta, por dificuldades familiares. Sukie não conheceu a mãe e tem uma não-relação com o pai, pelo que Nathan preenche um pouco o vazio paterno, ao mesmo tempo que serve de interesse romântico. My love for him felt so total and so annihilating that it was often...

Mary Ventura and the Ninth Kingdom

A publicação desta história inédita de Sylvia Plath tinha-me prendido desde o início (evento emocionante apenas para nerds  da literatura; ainda estou à espera dos Salingers prometidos em talvez 2013...) Mary Ventura and the Ninth Kingdom  foi escrito por Sylvia Plath em 1952, quando esta tinha 20 anos e ainda era estudante. Submeteu o conto à revista Mademoiselle , mas foi rejeitado e colocado na gaveta, até que a Faber o "resgatou" e decidiu publicar. Em 1952, Sylvia ainda não tinha feito o estágio que inspirou, posteriormente, The Bell Jar , ainda não tinha tentado o suicídio pela primeira vez, ainda não tinha conhecido Ted Hughes. Morreria, por suicídio, dez anos mais tarde. Conhecemos Mary Ventura (nome de uma antiga colega de escola de Sylvia) ainda com os seus pais, numa estação de comboio. Mary vai fazer uma viagem, sozinha, a contra-gosto, mas coagida pelos pais. Mary vai para "Norte", para um destino que desconhece, e não percebe por que motivo vai - tem r...

Tigers are Better-Looking

No âmbito do #lerosclássicos2021 , li este conjunto de contos da autora caribenha Jean Rhys. No ano passado, o tema de Julho era um clássico africano ou asiático; este ano, expandindo esta forma de exclusão do cânone ocidental, decidi incluir outras geografias menos lidas: a Oceania e o Caribe. (acho que nunca li nenhum livro de alguém da Oceania, mas tenho há demasiados anos, por ler, uma compilação de contos de Katherine Mansfield) De Jean Rhys, só tinha lido Wide Sargasso Sea , que é um livro do qual gostei mesmo muito (mais do que daquele que o inspirou !) e que acho que merece ser lido pelas várias temáticas que aborda: o sentimento de não-pertença, as marcas do colonialismo, a doença mental, a fragilidade feminina na sociedade. Tigers are Better-Looking  está muito longe de ser das obra mais conhecida da autora e, antes de lhe ter pegado, nem sabia que se tratava de contos. Esta edição entrou na minha colecção através do awesome books (choremos pelo Brexit), pois tinha sempr...

Coração de Vidro

 A vontade de reler e regressar a José Mauro de Vasconcelos era muita. E, antes de reler Meu Pé de Laranja Lima  (releitura que quero mesmo fazer - li o livro repetidamente no início dos anos 2000 e quero muito ver como a história se aguenta face ao meu envelhecimento) ou pegar na edição antiga que herdei de Rosinha minha canoa , calhou ler esta nova edição de Coração de Vidro  (por ser muito mais curta e eu estar à procura de uma pequena pausa na minha leitura de não-ficção actual). Não sabia o tema da obra, sabia apenas tratar-se de contos. É um belo conjunto de quatro pequenos contos sobre seres vivos não humanos - um pássaro, um peixe, um cavalo, uma árvore - cujas histórias têm como factores comuns o espaço físico em que decorrem, numa fazenda, e o papel da intervenção humana nas suas vidas. Baixou os olhos. Não chorou nem explicou mais nada. Que tristeza (agora começava a descobrir) as pessoas terem de crescer e perder o coração... Que tristeza dolorida as pessoas g...

The Complete Tales, Beatrix Potter

Uma leitura há muito aguardada. O imaginário de Beatrix Potter está comigo há muito; em garota, via uns desenhos animados baseados nas suas histórias. Talvez seja curioso mencionar que a história que mais me marcou, na altura, não foi a de Peter Rabbit (o seu nome mais sonante), mas as aventuras de Tom Kitten na história de Samuel Whiskers (uma verdadeira história de terror, acrescente-se). Vou, aliás, elaborar esse ponto: as histórias de Beatrix Potter não são necessariamente doces e repletas de finais felizes, como as histórias infantis a que a Disney nos tem habituado. A sanitização de histórias infantis por parte da Disney é, aliás, já muito conhecida - e é de conhecimento comum que os irmãos Grimm não escreveram as histórias mais felizes do mundo. Assim, e se nos identificarmos, de algum modo, com os personagens de Beatrix Potter, é normal que estas histórias tomem contornos amargos para o leitor. Se na história de Samuel Whiskers, é Tom Kitten, como personagem principal, que enfr...

O Terrorista Elegante e Outras Histórias

Esta novidade chamou-me imediatamente a atenção devido à sua dupla autoria. Pelos dois motivos: por ser escrito a quatro mãos, contrariando, como diz Mia Couto no prólogo, a ideia da escrita enquanto acto solitário; e pelos dois autores, embora tenha apenas lido, até à data, uma obra de Agualusa  (não obstante ter duas outras na estante). A expectativa era considerável, e a obra corresponde. O livro reúne três contos, ou novelas, e é a leitura ideal para fazer numa tarde mais descontraída. Todas são baseadas em peças de teatro, também da autoria partilhada de ambos, e essa fonte subentende-se na riqueza dos diálogos, nas didascálias disfarçadas no corpo do texto. Todo o livro está envolto na musicalidade e no humor típicos dos autores, sendo de leitura muito agradável, como era, aliás, de antecipar. O primeiro texto da obra, aquele que lhe dá título, traz-nos Charles Poitier Bentinho, um angolano elegante, que veste marcas caras e fatos de alfaiate, que é detido ...

Novas Estórias Açorianas

Novas Estórias Açorianas  é um conjunto de contos que acaba por não o ser. Isto porque cada estória é um relato quotidiano, um retrato de costumes, de comportamentos, de pessoas (mais ou menos) banais pelos Açores. E é já o segundo volume de estórias açorianas escrito por Carlos Alberto Machado. (confesso que não li o primeiro) Assim, estas estórias revelam as vidas de pessoas da vizinhança, através de memórias, documentos, de forma muito humana, demonstrando a importância da comunidade. Acompanhamos emigrantes (Canadá e Estados Unidos) regressados ou de férias, grupos de amigos, autarcas, um professor vindo de fora, personagens locais... todos eles vistos como que de fora, mas por quem está, na realidade, dentro. Todas as personagens têm um nome e uma identidade, sendo mais importantes que os acontecimentos, na sua maioria corriqueiros e passíveis de acontecer noutro local que não nos Açores - em qualquer lugar em que haja vida em comunidade, talvez. Fica uma vont...

Uma Aventura Secreta do Marquês de Bradomín

Há anos que estava para ler Teresa Veiga. Há anos -  a sério . Por recomendação de um amigo, cujos gostos levo muito a sério. Não desiludiu, como eu sabia (é claro!) que não ia desiludir.  Uma Aventura Secreta do Marquês de Bradomín  é um pequeno livro com três contos algo longos, vencedor do Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco em 2008 (prémio que a autora já ganhara em 1992). Outros autores que já ganharam este prémio: Maria Isabel Barreno , Maria Judite de Carvalho , José Jorge Letria , Teolinda Gersão , Urbano Tavares Rodrigues, Ondjaki .... Além daquele que lhe dá o título, temos os contos  As Parcas , a abrir o livro, e O maldito, Marianina e o feitiço da Rocha da Pena , para terminar. O conto que dá título à obra passa-se na década de 1920, com um jovem que lê, na biblioteca do avô, as longas memórias em três volumes do Marquês de Bradomín, soldado, político, aventureiro, amante da arte, Don Juan da Espanha das guerras civis carlistas....

Flores ao Telefone + Os Idólatras + Tempo de Mercês

O terceiro volume da Obra Completa de Maria Judite de Carvalho é o primeiro do qual eu não tinha ainda lido nada. Assim, parti com total desconhecimento para os três conjuntos de contos aqui apresentados (o volume IV está prestes a sair, e é outro do qual não li nada até agora - mas já sei que são crónicas!), tendo apenas como ponto de partida as expectativas extremamente elevadas, dada a qualidade a que a autora já me habituara. Mais uma vez, estas expectativas não saíram goradas; houve, no entanto, uma enorme surpresa: Os Idólatras . Mas já lá chegarei. O primeiro conjunto, de 14 contos, inicia, precisamente, com Flores ao telefone , um conto muito curto (sete páginas apenas) sobre uma mulher, Flores, que procura ao telefone três pessoas: uma colega de trabalho, o ex-marido e a suposta melhor amiga. O telefone, que deveria aproximar  e tornar o contacto mais fácil, torna-se aqui no símbolo do distanciamento, da comunicação sem significado. E as pessoas que Flores...

A Biblioteca

Bárbara Ferreira vai à biblioteca / requisita um livro intitulado A Biblioteca . Muita da minha curiosidade prendia-se também com a minha vontade de escapar ao cânone literário mais "comum", em termos de nacionalidades. Ex-Jugoslávia é sem dúvida uma lacuna enorme nas minhas leituras... Peguei, portanto, neste pequeno volume, sem saber ao que ia. Apenas sabia que seriam contos, por o ter tirado dessa prateleira (estou a adorar simplesmente olhar para as prateleiras da biblioteca e tentar perceber onde raio poderá estar o livro que procuro). Vi este livro frequentemente descrito como "fantasia", mas diria que é um mundo mais de Kafka que  de JK Rowling (das 72 páginas que li em 2001). Zoran Živkovic presenteia-nos com seis contos absurdos sobre bibliotecas e livros, nos quais é constante o questionar sobre o que se está a passar - seja por parte das personagens, seja por parte do leitor. Abre-se o desafio ao leitor para tentar compreender as histórias, m...